Por Rebecca Santoro
6 de agosto de 2008
RESUMO: Seria uma espécie de programa de anistia, certo? E o que tem acontecido nos países que solucionaram, com anistia aos revolucionários, seus problemas de luta armada contra grupos que pretenderam promover a revolução comunista pela via das armas? Em todos os lugares nos quais isso aconteceu, os ‘revolucionários’ acabam aparelhando as instituições e a mídia, o que, mais cedo ou mais tarde, provoca uma mudança no discurso de tratamento de seus atos e de suas posições político-ideológicas passados, de forma a que se transformem em heróis dos ‘pobres e dos oprimidos’, fazendo com que, já pelas vias ‘democráticas’, cheguem ao poder, e, de lá, comecem a se vingar de seus ‘inimigos’ e a implantar seus projetos de poder comunistas – todos, é claro, de longuíssimos prazos. Nós já vimos esse filme – estamos dentro dele agora mesmo.
A semana começou com a denúncia da revista colombiana Cambio de novas evidências sobre laços clandestinos entre o governo brasileiro e as Forças Armadas Revolucionárias Comunistas da Colômbia (Farc). Seriam 85 mensagens eletrônicas trocadas por representantes das Farc entre 1999 e 2008. Apreendidos nos computadores de Reyes - o número 2 das Farc, morto pelo Exército da Colômbia, na polêmica operação na fronteira com o Equador. Os arquivos chegaram às mãos do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e ainda foram objeto de uma conversa mantida pelo presidente brasileiro com o da Colômbia, Álvaro Uribe, na última visita que Lula fez a aquele país. Embora nenhuma das mensagens divulgadas até agora seja endereçada a autoridades ou a membros do PT e do governo brasileiros, existem diversas referências comprometedoras aos mesmos.
Novidade nestas ‘revelações’ só mesmo para aqueles que ainda insistem em se informar apenas através dos veículos de esquerda e dos de comunicação de massa (se é que falar assim não seja redundância) e o fato de que, agora, se possa ligar inúmeras revelações já feitas por sites como o Mídia Sem Máscara, por exemplo, com evidências representadas nos tais e-mails. Aliás, estou lendo o livro de Heitor de Paola – O Eixo do Mal Latino-Americano, recentemente lançado. Quem quiser se alfabetizar na história real do que vem acontecendo na América-Latina, leia – o livro é sensacional!
Voltemos às antigas revelações e às novas evidências.
Em 2005 (em 2005!!!), o jornalista Carlos I.S. Azambuja escrevia um artigo chamado ‘A guerrilha na Colômbia’ (http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=4333), no qual citava as ligações das FARC com governos da América Latina, principalmente por sua participação no Foro de São Paulo. Azambuja lembrava uma entrevista de Raul Reyes à Folha de S. Paulo, de 27 de agosto de 2003 (2003!!!), em que o próprio Reyes declarava abertamente que as FARC tinham “contatos, não apenas no Brasil, com distintas forças políticas e governos, partidos e movimentos sociais” e citava nomes: “... o PT e, claro, dentro do PT há uma quantidade de forças; os sem-terra, os sem-teto, os estudantes, sindicalistas, intelectuais, sacerdotes, historiadores, jornalistas...” e ainda os ‘intelectuais’ “Emir Sader, frei Betto e muitos outros”.
Azambuja dizia que “Essas relações, inclusive, com autoridades governamentais, são enormemente facilitadas pelos contatos estabelecidos pelos membros do Departamento Internacional das Farc”, formado por militantes que “desde a Argentina até o México, passando pelo Paraguai e Honduras”, mantinham “vínculos com membros de grupos de pressão de extrema esquerda e, em muitos lugares, realizam juntamente com o chamado crime organizado, atividades ilícitas como seqüestros, tráfico de drogas e contrabando de armas, além de inserir seus simpatizantes dentro de grupos sociais e de pressão”. Este ‘Departamento Internacional’ tinha “representantes na União Européia, Japão, Austrália, México, Canadá, EUA, Honduras, Costa Rica, Panamá, Cuba, Venezuela, Equador, Peru, Bolívia, Argentina, Chile e Brasil, isso apesar de ser considerada pelos EUA, OEA e União Européia uma organização”, revelava o jornalista em seu artigo.
Entre os e-mails agora revelados pela Câmbio, estão os de Olivério Medina (Cura Camilo) para Reyes:
De: 'Cura Camilo'
A: 'Raúl Reyes'
17 de janeiro de 2007
“Na segunda-feira, dia 15, a "Mona" começou em seu novo emprego e para garanti-la ou impedir que a direita em algum momento a hostilize, a colocaram na Secretaria da Pesca, trabalhando no que chamam aqui de cargo de confiança ligado à Presidência da República”.
De: 'Cura Camilo'
A: 'Raúl Reyes'
14 de abril de 2007
“Devo atuar com cautela para não facultar ao inimigo argumentos que levem a questionar o refúgio. Nesse sentido, ter conseguido a transferência de “La Mona” e “La Timbica” para a capital do país foi importante. Manterei essa discrição até a neutralização. Obtida esta, terei passaporte brasileiro, e a primeira coisa que devo pensar é ir vê-los”
Ora, quando o colunista da Veja, Diogo Mainardi, revelou que a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, pessoalmente, teria pedido a transferência da mulher do terrorista Olivério Medina, Angela Maria Slongo, para Brasília, o Ministério da Pesca informou que Mona apenas mandara um currículo e fora selecionada por critérios profissionais. Então, Mainardi não teve escolha: publicou o documento de pedido transferência oficial e assinado pela ministra. Encoberto por outros escândalos, o assunto ficou na ‘geladeira’. E agora, com mais esta prova contundente de que houve uma orquestração, a partir de dentro do Planalto para proteger Medina – o companheiro do Foro de São Paulo, ‘embaixador das FARC’ no Brasil, o que ‘inventará’ o governo como resposta?
Segundo o jornal El Tiempo, uma das funções de Medina, no Brasil, seria recrutar pessoas e traficar armas e que a principal fachada das Farc, hoje, seria a Coordinadora Continental Bolivariana (CCB), da qual Olivério integrava o comando, em companhia de Raúl Reyes e de Orlay Jurado Palomino, ou "Hermes", que estaria na Venezuela. O atual esforço da CCB seria tentar instalar-se nos EUA por intermédio de uma ONG e de uma entidade ambientalista.
Ambientalista? Isso mesmo. Recentemente, o site Mídia Sem Máscara publicou a tradução de um artigo de Cliff Kincaid – O Novo Comunismo – que falava sobre o livro Blue Planet in Green Shackles, do presidente da República Tcheca, Václav Klaus, denunciando que o movimento para “salvar” o meio ambiente foi tomado por ideólogos que defendem o controle total do governo sobre as nossas vidas. Klaus diz que o ambientalismo pode ser considerado uma forma de comunismo, de socialismo ou mesmo de fascismo. O resultado? Segundo o autor, será a extinção da liberdade humana. Cliff Kincaid lembra em seu artigo que “Staudenmaier escreveu que ‘a incorporação ao movimento Nazista de temas ambientalistas foi um fator crucial para a ascensão deles à popularidade e ao poder estatal’”... “Klaus, por seu lado, escreve que ‘a atitude dos ambientalistas em relação à natureza é análoga à abordagem marxista relacionada à economia. O objetivo em ambos os casos é substituir a evolução livre e espontânea do mundo (e da humanidade) pelo suposto planejamento otimizado central ou – utilizando o adjetivo mais elegante atualmente – global, do desenvolvimento mundial’”.
Voltemos novamente às antigas revelações e às novas evidências.
Outro que está comprometido pelos e-mails é o procurador da República Luiz Francisco de Souza, que, durante muito tempo, pertenceu aos quadros do PT, chegando a se candidatar a deputado federal pelo partido, não conseguindo ser, entretanto, eleito. Luiz Francisco é mencionado em um extenso e-mail de Olivério Medina (Cadena Colazzos) a Raúl Reyes, datado do dia 22 de agosto de 2004, relatando o diálogo que Medina havia tido com o procurador, que o aconselhava a como se proteger das investigações policiais: “Ande com uma máquina fotográfica e, quando possível, com um gravador, para o caso de voltar a acontecer de um agente de informação o fotografar e o gravar, tendo o cuidado de não permitir que ele pegue a câmara e o gravador. Que em relação com o sucedido fizemos uma denúncia dirigida a ele, como procurador, para fazê-la chegar ao chefe da Polícia Federal e à Agência Brasileira de Informação”.
Que investigações eram essas? Bem, a principal delas era sobre a doação de US$ 5 milhões das Farc para campanhas eleitorais do PT, em 2002, quando faltavam 6 meses para as eleições. Um agente da Abin, infiltrado na reunião, que aconteceu no dia 13 de abril de 2002, numa chácara nos arredores de Brasília, comunicou o fato a Agência Brasileira de Investigações (Abin), num documento datado de 25 de abril de 2002, que foi catalogado com o número 0095/3100 e que recebeu a classificação de “secreto”. O arquivo informava que na tal reunião, que durara cerca de 6 horas, havia um grupo de 30 pessoas - todos militantes de esquerda e simpatizantes das Farc - e Olivério Medina, que anunciou a doação dos US$ 5 milhões a candidatos petistas.
Numa CPI instalada já depois das eleições, o ex-general Armando Félix, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, disse que o fato não era verdadeiro e que o documento da Abin havia sido classificado como ‘secreto’ para que as informações não vazassem e viessem a prejudicar a campanha presidencial de Lula da Silva. Até hoje, não se sabe direito o que teria acontecido nesse episódio. Não deixem de ler a versão, bem oposta, dos agentes que participaram das investigações da Abin AQUI.
A mensagem agora revelada pela Cambio apenas reforçam as já conhecidas relações entre o procurador Luiz Francisco e o ex-padre Olivério Medina. Reportagem da revista Consultor Jurídico, publicada em maio de 2006, mostrou que o procurador interveio, indevidamente, na Justiça, em favor Medina. Atitude arriscada, porque colocava em xeque a autoridade do Supremo Tribunal Federal. O ex-padre era acusado de assassinato na Colômbia. Preso no Brasil, aguardava o julgamento do pedido de extradição. O STF, através dos ministros Carlos Britto e Gilmar Mendes, solicitou que ele fosse alojado no Centro de Internamento e Reeducação do Distrito Federal. Foi então que o procurador Luiz Francisco de Souza, que, aparentemente, nada tinha a ver com o caso, entrou em ação, pedindo à Justiça do Distrito Federal que o colombiano fosse devolvido à Polícia Federal – o que foi providenciado, sem que se desse ciência ao STF, porque o pedido foi encampado pelas autoridades interessadas do Distrito Federal — Ministério Público, Polícia Civil e pelo juiz da Vara de Execuções Criminais, Nelson Ferreira Junior. Dois meses depois do episódio, o guerrilheiro colombiano obteve asilo político do governo brasileiro. Nesse período, a mulher de Medina, servidora pública, conseguiu ser transferida para Brasília, onde pode permanecer com o ex-padre, que estava em prisão domiciliar na capital. Hoje, sabe-se que a transferência da mulher de Medina foi conseguida pela atuação direta da ministra Dilma Roussef, como já mencionei acima.
ACTUAR CON CAUTELA
14 de abril de 2007
De: 'Cura Camilo'
A: 'Raúl Reyes'
“Devo atuar com cautela para não facultar ao inimigo argumentos que levem a questionar o refúgio. Nesse sentido, ter conseguido a transferência de “La Mona” e “La Timbica” para a capital do país foi importante. Manterei essa discrição até a neutralização. Obtida esta, terei passaporte brasileiro, e a primeira coisa que devo pensar é ir vê-los”
Já está mais do que sabido que uma das principais estratégias dos terroristas é enviar ao exterior representantes que acabam ganhando o status de refugiados políticos. O jornal El Tiempo já forneceu alguns nomes de membros do grupo que atuam em vários países. Entre eles, está o de Francisco Antonio Caderna Collazos – o ex-padre Olivério Medina -: "(...) o contato das Farc, o 'Camilo' — casado com uma professora brasileira e encarregado de trocar cocaína por armas e do recrutamento de simpatizantes —, não pôde ser extraditado para a Colômbia porque goza do status de refugiado desde 2006".
A Abin – de Lacerda de Lula - está analisando o teor dos e-mails das Farc. Como a Folha da São Paulo revelou em julho (portanto, bem antes da Cambio) há mais de 60 brasileiros citados nos 85 e-mails apreendidos nos computadores de Reyes. Neles, além dos nomes acima referidos, também são mencionados assessores do próprio Lula, como Selvino Heck e Gilberto Carvalho, deputados, vereadores, acadêmicos e sindicalistas.
Foi Lula quem encaminhou o caso ao general Armando Félix, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, ao qual a Abin está subordinada. Como se sabe, uma análise preliminar havia concluído não haver vínculo direto entre integrantes do governo e membros das Farc. Não me digam...
O mais difícil, entretanto, é driblar as evidências, que acabam sendo noticiadas na imprensa como fatos isolados, mas que cuja interligação com o tema ‘governo do Brasil – as Farc’ não passa despercebida por analistas mais atentos.
Em 2004, por exemplo, uma ação da Polícia Federal apreendeu, numa lancha acidentada da guerrilha, no município de São Gabriel da Cachoeira (AM), região sob forte influência da guerrilha colombiana, cinco lotes de medicamento usado em tratamento contra leishmaniose - havia 2.768 ampolas de glucantime, substância distribuída exclusivamente pelo Ministério da Saúde e que saíram de Brasília, conforme investigação da PF, obtida em inquérito policial instaurado em novembro de 2004 para apurar o caso.
Como esse, há inúmeros outros fatos espalhados entre as notícias dos mais diversos jornais do continente.
Mas, o principal motivo desse artigo, a despeito da longa introdução que julguei necessário fazer, é tratar de números em relação às Farc e, a partir destes, fazer uma análise de qual teria sido o ‘cenário’ imaginado pela esquerda em ascensão do continente que acabasse favorecendo a transformação da guerrilha em partido político, sem desperdiçar, entretanto, o ‘talento’ narcoguerrilheiro-armamentista de parte de seu contingente – que poderá vir a ser útil aos objetivos revolucionários na região.
A Inteligência militar do governo da Colômbia revelou que, quando o presidente Álvaro Uribe chegou ao poder, em 2002, Bogotá estava cercada por várias frentes da Farc e sofria com o crime e o terrorismo. A guerrilha contava então com 19 mil membros, distribuídos em 70 frentes. Hoje, os seqüestros anuais diminuíram de 2.883 para pouco mais de 500; os atentados, de 1.645 para 328; as principais estradas do país já são novamente transitáveis; o Estado retomou o controle do território; o efetivo das Farc estaria em torno de 8 mil guerrilheiros e as frentes não passariam de 45 (a guerrilha, entretanto, insiste em informar que ainda contaria com 17 mil homens e mulheres em armas).
Façam as contas: seriam 8 mil homens a menos. De acordo com as autoridades colombianas, desde 2002, mais de 9.000 integrantes do grupo teriam deixado a guerrilha. Além disso, as informações são de que cerca de 3 mil dos guerrilheiros teriam sido mortos, 1 mil feridos. Somente no ano de 2006, de acordo com declarações do ministro da Defesa colombiano, Juan Manuel Santos, ao jornal "El Pais cerca de 2.500 combatentes haviam deixado a guerrilha. Para onde teriam ido? Teriam sido acolhidos por um programa do governo colombiano que beneficia quem aceita se entregar oferecendo benefícios jurídicos, subsídios e acesso à educação, à saúde e à capacitação profissional.
Seria uma espécie de programa de anistia, certo? E o que tem acontecido nos países que solucionaram, com anistia aos revolucionários, seus problemas de luta armada contra grupos que pretenderam promover a revolução comunista pela via das armas? Em todos os lugares nos quais isso aconteceu, os ‘revolucionários’ acabam aparelhando as instituições e a mídia, o que, mais cedo ou mais tarde, provoca uma mudança no discurso de tratamento de seus atos e de suas posições político-ideológicas passados, de forma a que se transformem em heróis dos ‘pobres e dos oprimidos’, fazendo com que, já pelas vias ‘democráticas’, cheguem ao poder, e, de lá, comecem a se vingar de seus ‘inimigos’ e a implantar seus projetos de poder comunistas – todos, é claro, de longuíssimos prazos. Nós já vimos esse filme – estamos dentro dele agora mesmo.
Com políticos ligados, senão às próprias Farc, pelo menos a seu perfil ideológico, já plenamente instalados na vida política colombiana, somados à massa ‘desertora’ do grupo e aos simpatizantes, poderíamos ver nascer daí, ‘novas forças políticas’ na Colômbia. De perfil de esquerda, é claro, e perfeitamente alinhado ao estabelecido pelo Foro de São Paulo – de Lula, de Fidel (de Raul), de Chavez, de Ortega, de Evo, dos Kirschner, etc. Mais tarde, chegariam ao poder, pelas vias democráticas.
Paralelamente, as atividades narcogerrilheiras da organização se espalhariam pela América Latina, descentralizando-se, através de ‘dissidentes’ das Farc (e da ELN) que seriam ‘adotados’ pelos mais diversos ‘movimentos sociais’ e poderosas organizações criminosas (máfia chinesa, máfia russa, PCC, CV, Al Qaeda), todas escondidas por trás de grupos criminosos, aparentemente surgidos das práticas de crime comum (assalto, tráfico de drogas, seqüestros, contrabando, etc.). Afinal, quantas já são as denúncias, no caso do Brasil, por exemplo, de ligações das Farc com tantos desses grupos, que, realmente, diga-se de passagem, já adotam, visivelmente, táticas de ação de guerrilha?
Sem querer desmerecer o trabalho honesto de muitos inocentes úteis que, sinceramente, combatem a guerrilha colombiana, e seu terrorismo, querendo a paz e a prosperidade da Colômbia, e da própria América Latina, não se pode desconsiderar esta hipótese na rápida ‘eliminação’ das Farc.
Com a palavra, os senhores e senhoras estrategistas e especialistas em crime organizado...