terça-feira, 19 de agosto de 2008

DEPENDE DA VERDADE, DEPENDE DA MENTIRA

DEPENDE DA VERDADE, DEPENDE DA MENTIRA


Por Rebecca Santoro

9 de maio de 2008


Todo mundo viu e ouviu a ministra Dilma Rousseff responder, na CPI dos Cartões Corporativos, ao questionamento do senador José Agripino Maia (DEM) a respeito de declarações da ministra de que teria mentido “muito, muito” sob tortura, segundo Dilma, durante os anos em que esteve presa por participar de movimento de luta armada para implantar no Brasil a ditadura comunista.


O senador, se vivesse em país cujo discurso do think-tank fosse coerente com a realidade, até poderia ter atingido seu objetivo, que era o de mostrar que a ministra segue a regra de mentir, se necessário, em nome de uma causa a que sirva – até sob tortura. Mas, como se diz na gíria, o senador acabou foi levantando uma bola redondinha para o adversário devolver com uma cortada avassaladora. Foi o que a ministra fez, com a já conhecida competência revolucionária que possui, ao dizer que se orgulha muito de ter mentido para não entregar companheiros de luta.


Na minha experiência televisiva, ao ver filmes que mostram tortura, só há duas saídas para o interrogado: dizer ou fazer o que seus torturadores quiserem que diga ou faça ou morrer. Evidentemente, a ministra não morreu e nem ficou desfigurada. Paro por aqui.


Aliás, deve-se fazer um parêntesis para parabenizar seu aplicador de Botox: ficou ótimo – a ministra fez caras e caretas e sua testa e o entorno de seus olhos não enrugaram um milímetro sequer. A ministra, com a colaboração dos efeitos da dieta que andou fazendo, parece dez anos mais jovem.


Se não tinha capacidade para reagir a muito provável cortada que receberia em troca da pergunta que preparara para a ministra, o senador José Agripino não deveria tê-la feito. Poderia ter rebatido dizendo que a ministra mente, sim, se for para o bem de sua causa, o que poderia ser exatamente o caso de seu depoimento na CPI dos cartões. Mas, preferiu perder mais tempo e gastar suas cordas vocais explicando que era contra o regime de exceção – regime, aliás, que acabou sendo imposto justamente por causa de gente, como a ministra, que insistia em transformar o Brasil numa república comunista, pela luta armada.


Em seu depoimento, diante de uma oposição plácida – que só é oposição mesmo na disputa de cargos e no discurso de palanque -, Dilma Rousseff continuou a repetir que o dossiê com os gastos do ex-presidente FHC, de sua família e de seus assessores mais próximos, foi apenas a composição de um banco de dados que teria vazado à imprensa e cujo autor deste vazamento estaria sendo procurado em investigações da ‘confiável’ polícia federal (aquela que disse que não teve grampo nos ministros do TSE e do STJ; que prendeu um arrozeiro, toda a sua família e seus empregados por defenderem suas terras invadidas por um bando de gente também armada e disposta a tudo para expulsá-los de suas terras; e, só mais um exemplo, aquela que até hoje não descobriu quem deu o dinheiro para pagar outro dossiê petista, dessa vez contra José Serra e Geraldo Alkimin, nas últimas eleições presidenciais).


Num país completamente aparelhado pelo partido que está no governo, não se poderia esperar nada diferente de uma CPI, como já ficou provado com o resultado de tantas outras que já aconteceram. Não há escândalo e nem crime capaz de fazer com que o PT e seus aliados saiam do poder. O que acontece é que todo mundo finge que não sabe perfeitamente disso e vai procurando um perfil de honestidade-eleitoreira-inofensiva atrás do qual possa se esconder para terminar seus dias de bem com o bolso.


É o caso de gente que não é político profissional, como o do apresentador desde-sempre-vasilina Jô Soares, que retirou do ar suas “meninas do Jô”, que tratavam, o mais honestamente que lhes era possível, de política, e que, agora, só trata do assunto, quando a ‘vítima’ não é do governo ou para defender seus amigos revolucionários dos anos 60. Sobre a atuação de Dilma, por exemplo, fez uma bela e breve apologia, aproveitando para debochar do senador José Agripino, falando de sua ‘carinha de sem graça’ e do pequeno erro de português que o mesmo havia cometido durante sua fala na CPI. Jô Soares corrigiu o erro do senador no ar e ainda debochou dizendo que “senador, afinal, não tem obrigação de saber o português correto”.


Lembro ao apresentador, como ele lembrou ao senador a correta maneira de se falar nossa língua, que, a julgar pelo português do senhor que se encontra na presidência da república, o senador, REALMENTE (ao contrário do deboche feito pelo apresentador), não precisaria saber nem o básico da língua – o que não é a realidade no caso do senador Agripino, diga-se de passagem. Mas, para o apresentador-vasilina, e que se arroga não preconceituoso (embora saibamos que só com o que lhe convenha, é claro), presidente pode!


Assistam, abaixo, ao vídeo montado com a reportagem da Globo sobre o depoimento da ministra e a reação do valente-vasilina Jô Soares, que, como ele mesmo disse em relação ao senador Agripino, também perdeu uma excelente oportunidade de ficar calado.





Matéria do Jornal da Globo Completa:




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