Por Rebecca Santoro
O cidadão entra numa loja para comprar uma roupa. Passa horas escolhendo e experimentando diversas peças, meticulosamente. Finalmente, faz suas escolhas, manda embrulhar e calcular o valor da compra. Foram duas camisas, duas claças, duas cuecas, dois pares de meia e dois cintos. Efetua o pagamento e recebe a sacola com seus novos pertences. Ao abrir a sacola para confeir os itens, a surpresa: a quantidade era realmente a da compra efetuada, mas somente parte dos itens era a dos que haviam sido escolhidos pelo cidadão. Uma das camisas, uma das calças, uma das cuecas, um dos pares de meia e um dos cintos tinham sido substituídos, respectivamente, pelo mesmo tipo de peça, só que de modelo e de cor diferente - eram todos de cor vermelha, com uma estrela branca. "Mas o que significa isso?" perguntou, indignado, o cidadão. "É que, agora, é assim: o cidadão escolhe, paga, mas o governo é quem decide parte do que ele vai levar!", esclarece o vendedor. Cena de teatro do absurdo? De filme de ficção científica cujo autor tem mania de ver conspiração em tudo? Pode ser. Mas, é exatamente isso o que vai acontecer com os consumidores de TV a cabo, no Brasil, se o Projeto de Lei n° 29/07, que estabelece um complexo sistema de cotas para programação de conteúdo nacional, a ser transmitido durante o horário nobre, se ele passar pelo Congresso como está.
O PL que está em andamento no Congresso estabelece inúmeras obrigações e restrições ao serviço de TV por assinatura do Brasil, definindo, inclusive, o que você vai ter que assistir e em que horário essa programação irá passar. O objetivo seria impulsionar a produção nacional de conteúdo para TV a cabo. Um absurdo que, certamente, além de aumentar o valor mensal da assinatura, vai fazer o cidadão pagar para que gente que deveria estar trabalhando no setor privado (assim como a indústria cinematográfica), num mercado tão amplo, embora também tão competitivo, faça suas produções. Para, depois, vir aquele festival de inverdades que a indústria nacional de filmes financiados pelo Estado costuma produzir.
Especialistas (*) calculam que a despesa do serviço de TV por assinatura ganhará um adicional de aproximadamente 80% em apenas ano e, em quatro anos, o preço dos pacotes básicos aumentará algo em torno de 82,6%. Isso representaria uma perda potencial de 3,92 milhões de assinantes até 2010, apenas em razão do aumento do valor mensal da assinatura, além do que o mercado poderia vir a perder com novos assinantes potenciais – totalizando uma perda de 4,4 milhões destes.
A ABPTA (Associação Brasileira de Programadores de TV por Assinatura) revela que, para cumprir as medidas complexas e absurdas trazidas na atual redação do Projeto de Lei n° 29/07, seria necessário retirar canais já consagrados do ar ou adquirir novos canais - o que demandaria altos investimentos, além de resultar no aumento da mensalidade dos assinantes.
O tal PL visa revogar a cláusula dos contratos de concessão pública que proíbe a prestação dos serviços de TV por assinatura pelas concessionárias de telefonia fixa. Afinal, a Telemar doou tantos mimos financeiros a um dos pimpolhos do presidente Lula - o "Ronaldinho" da comunicação e o mais novo milionário do país (não, não é o Rafinha que ganhou 1 milhão no BBB8) não deve ter sido pelos índices de QI do ex-funcionário de zoológico. A ABPTA relata que o PL n° 29/07 não se preocupa em estabelecer um mercado equilibrado e harmonioso, onde as restrições e atribuições seriam compartilhadas por todas as empresas envolvidas, e que, ao contrário, promoveria uma série imensa de distinções que, entre outras coisas, permitiria intervenções severas nos meios de comunicação: "para assegurar que a competição continue se desenvolvendo no mercado de TV por assinatura, é necessário que existam salvaguardas suficientes para não favorecer uma concentração de redes em grandes conglomerados econômicos. Estas condições se resumem na efetivação da portabilidade numérica, implementação da desagregação de redes e o estabelecimento de assimetria tarifária".
Para que o leitor entenda melhor o que se passa, é preciso que conheça a imposição legal que já existe para todas as empresas que oferecem o serviço de TV a cabo. Apresento-lhes o Must Carry (Conteúdo Obrigatório), que é o termo adotado para definir o conjunto de canais que devem ser obrigatoriamente distribuídos pelas operadoras, como TV Senado, TV Câmara, TV Escola, Futura, TV Justiça e outros. Pois bem, apesar de representar uma espécie de recompensa ao governo (o que deveria ser uma recompensa à população) pelas concessões que oferece para que os canais a cabo sejam transmitidos, é preciso reconhecer que, para as operadoras, esta imposição representa um custo, já que a sua infra-estrutura está sendo utilizada compulsoriamente, sem qualquer remuneração, ocupando o lugar de outro canal que poderia ser distribuído. Como se não bastasse, o atual Projeto de Lei n° 29/07 estabelece uma nova quantidade exorbitante de canais que deverão ser ofertados obrigatoriamente nos pacotes, que inclui, além dos canais abertos das geradoras locais, mais 10 canais.
Você conhece a TV Globo? Ou quem sabe a TV Bandeirantes? É claro que sim e, portanto, no caso do Brasil, com suas peculiaridades próprias, são mais de 190 milhões de testemunhas de que nossa TV aberta já produz programação nacional mais do que o suficiente, inclusive com profissionais da terra, e, ainda por cima, com qualidade exemplar (ao menos na produção - o conteúdo é discutível; mas é nacional e disso não há dúvidas). Ao impor uma cota antidemocrática e arbitrária na TV por assinatura, além de representar uma interferência excessiva na TV por assinatura, cria-se, necessariamente, uma reserva de mercado, e não uma melhoria na qualidade da TV por assinatura e fomento eficaz à produção nacional. No Brasil, a TV a Cabo é apenas um complemento da TV aberta e que, por acaso ainda não chega ao nível do que se possa chamar de massificado. A proposta de cotas, portanto, vai na contramão da sua característica principal: que é dar ao assinante uma pluralidade de canais variados, como uma forma de opção à programação transmitida na TV aberta.
Como se não bastasse todas essa arbitrariedade com as cotas nacionais na TV por assinatura, o atual PL define que apenas produções nacionais com até 5 anos de realização serão válidas para fins de cálculo destas cotas. Ou seja, "Central do Brasil", por exemplo, um clássico do cinema nacional, premiado internacionalmente e que dispensa comentários em favor, por sua excelência consagrada, não pode mais ser exibido dentro da cota nacional. O mesmo acontecerá com "Tropa de Elite" a partir de 2012. Um outro filme qualquer, mesmo que seja insuportavelmente ruim, desde que tenha sido produzido e veiculado antes dos últimos 5 anos, é que deverá consumir o horário da cota de conteúdo nacional. Ninguém vai ver, é claro, e a empresa perderá dinheiro. Não que isso seja problema para o governo, que certamente vai pagar esse prejuízo com o dinheiro de nossos impostos, é claro. O próprio PL já acrescenta um imposto a ser cobrado de quem fizer assinatura de TV a cabo - a contribuição para o fomento do audiovisual - sem considerar que já dispões de várias fontes para o fim de incrementar a produção nacional de audiovisual, como o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), por exemplo, que é uma contribuição criada para viabilizar o dever legal das concessionárias públicas de universalizar a telefonia fixa (que conta com mais de R$ 5 bilhões em caixa, recolhidos entre empresas de telefonia e de TV por assinatura).
E tem mais: como é preciso uma grande quantidade de programas e de filmes para preencher a programação dos canais – uma média de pelo menos 12 programas por dia – num primeiro momento, é certo que teremos um festival de reprises de tudo o que se viu de produção nacional no país nos últimos 5. Muito animador... Voltamos à Idade da Pedra... Tudo bem, quem sabe poderemos assistir à reprise do Jornal Nacional, ou a do Globo Repórter, afinal... Que otimismo, não - se é que isso é possível. Não. Sabe por quê? Porque, em sua nova versão, o PL n° 29/07 estipula que canais essencialmente jornalísticos, esportivos, religiosos, políticos - além de todos os canais abertos e obrigatórios (denominados “Must Carry”, como TV Senado, TV Câmara, TV Escola, Futura, TV Justiça e outros - estão excluídos do cumprimento da cota de conteúdo nacional). Não é só isso. Mesmo que um filme seja produzido no Brasil, com atores brasileiros, figurinos brasileiros, contando uma história folclórica do nordeste brasileiro, nada disso o qualifica, segundo o PL 29/7, como de conteúdo nacional ou mesmo como um filme nacional.
Ainda bem que empresas como a FIAT, por exemplo, que fabrica automóveis, não produz conteúdo audiovisual. Pois, segundo os conceitos de nacionalidade explícitos no PL 29/7, todos os carros produzidos por esta empresa, ainda que aqui no Brasil, seriam legitimamente italianos e PT saudações. E as estatísticas do governo Lula sobre a produção nacional de automóveis, hein?! Iriam para as cucuias....
Pasmem! Da forma como está redigido, este projeto de lei desconsidera todo conteúdo apresentado na TV aberta como conteúdo nacional. Canais como GNT, Canal Brasil e Multishow (cujas sedes são localizadas no Brasil e que possuem na uma programação essencialmente nacional, também ficam sujeitos as cotas! Além disso, segundo denúncia da ABPTA, "canais já consagrados na TV por assinatura, que não possam cumprir os critérios do atual Projeto de Lei nº 29/07, ficam ameaçados de saírem dos pacotes oferecidos atualmente. Por exemplo, canais como o TNT, Sony, Warner, Eurochannel, Cartoon Network, National Geographic, Disney, MGM, Universal, FOX e muito mais".
A ABPTA propõe uma série de medidas para ampliar a produção nacional de conteúdo audiovisual que passariam longe da adoção das que propõe o PL 29/7. Revisar a incidência tributária, seria uma delas, além do aprimoramento de mecanismos já consagrados de fomento, como aqueles estabelecidos na Lei Rounaet, para incentivar o desenvolvimento de obras audiovisuais nacionais e o patrocínio de produções nacionais. Outra medida seria permitir que parte do recurso do FUST fosse utilizado com a finalidade de fomentar a produção nacional. Combater a pirataria e aumentar a fiscalização para que os produtores nacionais fossem devidamente remunerados também seriam medidas positivas. Incentivar investimentos estrangeiros em produções nacionais - que geraria empregos, no setor, dentro do país - não seria nada mal e muito menos inviável. Uma coisa é clara: Cota para programação de conteúdo nacional durante o horário nobre na TV por assinatura não cria demanda! Quem conhece a Voz do Brasil, programação que é transmitida, obrigatoriamente, pelas rádios de todo o país, entre as 19 e 20 horas, diariamente, de segunda a sexta-feira, que o diga.
É costume de toda boa reportagem apresentar equilibradamente os dois lados, ou os vários deles, de todas as questões e/ou acontecimentos. No Brasil, isto está começando a fazer parte do passado. Não, não as boas reportagens, mas a apresentação dos vários lados. É que no governo de dom Luiz Inácio e do PT, está ficando cada vez mais dispensável mostrar o lado que o partido ou governo defendem - simplesmente porque é sempre e invariavelmente o lado explicitamente, ou ilegal, ou inoportuno, ou nocivo aos interesses públicos, ou ainda nocivos à liberdade e à democracia. De modo que está ficando sem sentido ocupar espaço na mídia para mostrar o lado daqueles que defendem o óbvio indefensável. É o que farei neste artigo. Pouparei o leitor de argumentos que ofendem sua inteligência ao defender um PL de caráter obtuso, arbitrário, xenófobo, “coronelesco” e “chavista”.
TV por assinatura não é problema seu? Não é problema da maioria dos brasileiros? Pode não ser mesmo, já que a maior parte de nossa população não assina tv. Mas, a questão não é o objeto em discussão, mas a atitude daqueles que pretendem controlar a tudo e a todos, a atitude de censura, a atitude de se meter num serviço que teria a característica de ser privado.
Como fala o texto da Liberdade na TV(#), “hoje, as restrições da atual redação do Projeto Lei nº 29/07 estão baseadas na definição de conteúdo nacional e na imposição de cotas. E amanhã? Qual será a base para definir restrições nos veículos de comunicação? Alinhamento político? Que outro critério poderia ser adotado a partir daí? E se a ameaça hoje é no conteúdo veiculado na TV por assinatura (que por princípio deveria ser uma escolha individual do assinante, já que não se trata de exibição em plataforma de regime público), o que impediria futuras restrições à Internet? À TV aberta? Aos celulares? Aos telefones?”
ASSISTA AO VÍDEO E ENTENDA
VEJA A ÍNTEGRA DO PL 29/7 CLICANDO AQUI
VEJA O SITE DA ABTA (LIBERDADE NA TV)
Rebecca Santoro
E-mail: rebeccasantoro@gmail.com
Imortais Guerreiros - http://www.freewebs.com/imortaisguerreiros/index.htm
A VOZ DOS GUERREIROS - http://imortaisguerreirosnossavoz.blogspot.com/
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MEMÓRIA MÍDIA SEM MÁSCARA: http://www.freewebs.com/imortaisguerreiros/mdiasemmscara.htm
(*) Informação obtida do estudo econômico “Impactos Econômicos das Cotas e Desestímulo ao Capital Estrangeiro no Mercado Brasileiro de Televisão por Assinatura” elaborado pela Instituto Pezco de Pesquisa e Consultoria, em fevereiro de 2008, para ABPTA (Associação Brasileira de Programadores de TV por Assinatura).
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